No
embalo da recente polêmica envolvendo o ensino do criacionismo nas escolas, o jornal O
Estado de S. Paulo deste domingo publicou duas matérias relacionadas com o
assunto. Na primeira, “Jovens brasileiros conciliam bem ciência e religião”, é dito que “a maioria dos jovens brasileiros vive em paz com suas crenças
religiosas e a ciência da teoria evolutiva. Tem fé em Deus e, ao mesmo tempo,
concorda com as premissas estabelecidas por Charles Darwin mais de 150 anos
atrás, de que todas as espécies da Terra - incluindo o homem - evoluíram de um
ancestral comum por meio da seleção natural”. A legenda abaixo da imagem que
ilustra a matéria (essa aí acima) evidencia o esforço conciliatório do
darwinismo brasileiro (consciente da força da religião em nosso país): “Futuro?
Uma interpretação mais elástica das doutrinas religiosas e mais sensível à
ciência.”
A
reportagem explora os dados obtidos a partir de um questionário sobre religião
e ciência respondido por estudantes de escolas públicas e privadas de todas as
regiões do País, com média de 15 anos de idade. Se os pesquisadores mal sabem do
que se trata o criacionismo, o que se pode esperar desses adolescentes
geralmente mal informados sobre questões científicas e/ou filosóficas?
“Ainda
vamos fracionar e analisar mais profundamente as estatísticas, mas já dá para
perceber que os alunos religiosos brasileiros são bem menos fundamentalistas do
que se esperava”, avalia Nelio Bizzo, coordenador da pesquisa. Nessa declaração
de Bizzo, fica evidente que cada vez mais o termo pejorativo “fundamentalistas”
vai sendo aplicado aos criacionistas que creem no relato literal da criação em
Gênesis. Isso é perigoso e explico por que neste vídeo (em três partes).
A
ideia de darwinistas como Bizzo é convencer esse exército de jovens religiosos de
que é possível crer sem, necessariamente, dispensar Darwin. Numa nação
majoritariamente católica e de interpretação liberal da Bíblia, isso não é
difícil (é bom lembrar que os donos do Estadão
também são católicos e que de vez em quando é realizada uma missa nas
dependências do jornal). (Clique aqui para saber
por que evolução e Bíblia são incompatíveis.)
Bizzo
diz ainda que “a porcentagem dos que rejeitam completamente a origem biológica
do homem é menor que a de evangélicos da amostra, o que é uma surpresa, já que
os evangélicos no Brasil costumam ser os mais fundamentalistas na interpretação
do relato bíblico. A teoria evolutiva é talvez a coisa mais difícil de ser
aceita do ponto de vista moral pelos religiosos. Mesmo assim, os dados mostram
que a juventude brasileira é sensível aos produtos da ciência.” Aqui se
destacam duas coisas: (1) muitos evangélicos adotam a teologia liberal e poucos
são realmente bíblicos (estes, sim, considerados “fundamentalistas”), o que
mostra que cada vez mais um pequeno grupo vai se destacando como
verdadeiramente criacionista; e (2) o velho esforço para associar macroevolução
(metafísica) com ciência (experimental), o que não é correto.
Depois
de explicar alguma coisa da teoria da evolução (e nada de explicar criacionismo
nem design inteligente), o Estadão cita o físico e teólogo Eduardo
Cruz, professor do Departamento de Ciência da Religião da Pontifícia
Universidade CATÓLICA de São Paulo: “O problema é que a maioria dos estudantes
- ainda mais com 15 anos - não tem muita clareza sobre o que está envolvido na
teoria darwiniana [muito menos sobre o que está envolvido no modelo criacionista].
Com isso há o potencial de surgirem respostas contraditórias.”
Em
seguida, o Estadão recorda a pesquisa nacional realizada pelo Datafolha em 2010,
com 4.158 pessoas acima de 16 anos, que indicou que 59% dos brasileiros
acreditam que o homem é fruto de um processo evolutivo que levou milhões de
anos, porém guiado por uma divindade inteligente – ou seja, é o velho jeitinho
brasileiro. Só 8% acreditam que o homem evoluiu sem interferência divina, e
esses são os mais coerentes, pois entendem que, no fim das contas, o darwinismo
é uma teoria naturalista ateia.
A
segunda reportagem, “Biólogos querem reforçar ensino da evolução”, informa que, “preocupado com a maneira ‘anticientífica’ com que alguns
pesquisadores vêm questionando publicamente a teoria evolutiva, um grupo de
cientistas está propondo à Universidade de São Paulo a criação de um Núcleo de
Apoio à Pesquisa (NAP) sobre Educação, Divulgação e Epistemologia da Evolução
Biológica. O problema, segundo eles, é que os questionamentos não são feitos
com base em argumentos científicos, mas em dogmas religiosos ‘disfarçados’ de
ciência”.
“Temos
assistido a alarmantes manifestações de membros da comunidade científica se
posicionando publicamente a favor da perspectiva criacionista, distorcendo
fatos para questionar a validade científica da evolução biológica”, justificam
os pesquisadores na proposta de criação do NAP, submetida à USP no mês passado.
“Tais ações visam a influenciar os currículos escolares brasileiros, por meio
de polemistas que ostentam supostas credenciais científicas e utilizam
argumentos pretensamente complexos extraídos de diferentes campos.”
A
matéria cita o cientista brasileiro Marcos Eberlin (foto acima), da Unicamp (leia entrevista com ele a fim de conferir suas credenciais e ideias). Se o Dr.
Eberlin é tido como polemista descredenciado, o que se pode esperar por parte
da mídia em relação aos outros “simples criacionistas fundamentalistas”? Isso é
que é exemplo de argumento ad hominem
– melhor atacar a pessoa do que discutir as ideias dela.
A
matéria menciona a carta enviada à Academia Brasileira de Ciências (ABC) em março, na qual 15 membros manifestam “preocupação
com a tentativa de popularização de ideias retrógradas que afrontam o método
científico”, por meio da “divulgação de conceitos sem fundamentação científica
por pesquisadores de reconhecido saber em outras áreas da ciência”, e admite
que o alvo das críticas é o Dr. Eberlin: “O nome que não é citado nos
documentos, mas que é o foco da preocupação, é o do bioquímico Marcos Eberlin,
da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Depois de reconhecer o
currículo do cientista, o texto acrescenta um “mas”: “mas defende, no que diz
respeito à evolução, uma teoria que a maioria dos cientistas considera ser de
natureza puramente religiosa: a do design
inteligente, segundo a qual a vida na Terra não evoluiu naturalmente, mas foi
projetada e guiada por um criador.”
No
meu entender, a pior distorção é esta: “Evangélico, Eberlin é adepto da linha
criacionista, que rejeita a evolução biológica [o criacionismo não rejeita todos os aspectos do darwinismo]. Ele
crê que todos os seres vivos foram criados por Deus da maneira como existem
hoje [quando é que vão entender DE UMA VEZ POR TODAS que criacionistas bem
informados não são fixistas?]. “Não aceito a evolução porque as evidências
químicas que tenho falam contra ela. É uma falácia”, disse Eberlin ao Estado. Mas o Estado não se deu ao trabalho de conhecer essas evidências.
“Estamos
há 150 anos defendendo uma coisa que não é verdade”, diz ele. “Do ponto de
vista molecular, a teoria simplesmente não fecha as contas. Gostando ou não, a
gente tem de admitir isso”, disse Eberlin, na última de suas poucas frases
publicadas na matéria. E o texto acrescenta: “Em suas palestras, Eberlin diz
que as evidências científicas corroboram perfeitamente os relatos bíblicos
sobre a criação do universo e da vida, mesmo ‘quando dizem que o homem foi
feito do barro’. ‘Não temos acesso a Deus, mas temos acesso à sua obra’, diz.”
É realmente admirável que um cientista desse quilate tenha coragem de ir contra
o mainstream científico. Postura
comparável à dos grandes pais da ciência, como Galileu e Copérnico, que foram
contra a igreja oficial e a academia de sua época, ambas, curiosamente, novamente
de mãos dadas contra os que seguem a Bíblia e os cientistas que pensam de modo
diferente do naturalismo filosófico reinante. A história parece realmente se
repetir. Só falta esse poder mancomunado outra vez acender as fogueiras contra
os “hereges”.
Segundo
o Estadão, “o que mais preocupa os
evolucionistas é o fato de Eberlin apresentar o design inteligente como uma teoria científica válida, dizendo ter ‘provas’
de que a vida foi criada por Deus e de que a evolução biológica não é viável.
Uma argumentação que, segundo [o geneticista Francisco] Salzano, dá força a
segmentos religiosos que querem tornar o ensino do design inteligente obrigatório nas aulas de ciência ou cercear de
alguma forma o ensino da própria evolução”. Novamente o repórter não se dá ao
trabalho de perguntar ao Dr. Eberlin que provas são essas. Mas o mais irônico
de tudo é a maneira como os darwinistas e a mídia comprometida com essa visão
de mundo acabam virando o jogo. Na verdade, são os darwinistas que querem
impedir o ensino do criacionismo mesmo em escolas confessionais, e agora vêm
dizer que são os religiosos que querem “cercear” o ensino da evolução?! Não
sabem que as escolas adventistas, por exemplo, também ensinam o evolucionismo?
Mario
de Pinna, do Museu de Zoologia da USP, também é citado na reportagem (você
contou quantos evolucionistas foram entrevistados contra apenas um
criacionista?). Para ele, é preciso melhorar muito ainda o ensino da teoria
evolutiva no Brasil. “A quantidade de gente que dá aula de Biologia e não
entende evolução é infelizmente muito grande”, diz. “Precisamos de um esforço
amplo de educação e divulgação para suprir essa deficiência.” Se é assim
para os evolucionistas, o que se poderia dizer quanto ao criacionismo? Quantos
professores estariam aptos a tratar das premissas criacionistas com precisão?
Por esse e outros motivos, o ensino do criacionismo não pode mesmo ser
incentivado em escolas públicas.
A
despeito da intenção clara dessas duas reportagens, pelo menos para uma coisa
elas servem: mostrar as estratégias darwinistas apoiadas pela mídia:
1.
Procurar mostrar que evolução e religião são “compatíveis”.
2.
Aprimorar o ensino da evolução nas escolas fundamentais e o preparo/doutrinação
dos professores.
3.
Descaracterizar as pessoas (cientistas ou não) que ensinam criacionismo e/ou design inteligente.
Os
criacionistas precisam acordar para estes novos tempos. O assunto está saindo
dos círculos restritos e ganhando a imprensa popular. Vai chegar também às
escolas e às rodas de bate-papo. O que estamos fazendo para tornar clara nossa
visão de mundo?
Igrejas,
escolas, professores e cientistas criacionistas precisam ser mais proativos na
disseminação coerente, lógica e equilibrada de suas ideias. Os professores
precisam ser mais bem capacitados para ensinar o criacionismo e aproveitar o know-how de instituições como a Sociedade Criacionista Brasileira, que ministra cursos
de capacitação e publica obras de referência em criacionismo.
Enfim,
novos tempos e novos desafios exigem nova postura e novas estratégias.
Michelson Borges
Sociedade criacionista Brasileira
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